Mais de 90% das pessoas não reportariam condutas antiéticas no ambiente profissional.
Esse foi um dos resultados revelados em uma pesquisa realizada pelo CPDEC – Centro de Pesquisa, Desenvolvimento e Educação Continuada, em parceria com o NEIT – Núcleo de Economia Industrial e Tecnologia da Unicamp.
Na pesquisa ‘Ética nas Organizações’, foram entrevistados 812 profissionais de diversos segmentos, que trabalham em empresas públicas, privadas ou de capital misto. A maioria deles está inserida no mercado de trabalho há mais de uma década (73%) e atua em empresas de grande porte (57%) que contam com mais de 1.001 funcionários. 87% dos entrevistados exercem cargos de liderança, sendo que 68% são diretores ou gerentes.
De acordo com o estudo, atitudes antiéticas não são reportadas porque as pessoas temem retaliação por parte de colegas ou gestores (97%) e/ou acreditam que nenhuma ação corretiva será tomada (94%). Além dessas razões, o receio de que a confidencialidade não seja mantida é apontado por 92% dos respondentes, ainda que a empresa tenha ferramentas para que os funcionários comuniquem certas situações de forma anônima (o estudo mostrou que 66% das empresas disponibilizam tais mecanismos).
Segundo especialistas, os dados evidenciam que apenas criar ferramentas desse gênero não é suficiente porque, na prática, não existe credibilidade neste processo. Para eles, as empresas devem criar formas mais eficazes de ouvir seus profissionais, sem que eles se sintam desconfortáveis ou receosos.
Outros resultados da pesquisa ‘Ética nas Organizações’
Outros dados foram revelados no estudo, que indicou que 76% das empresas têm código de ética (100% das organizações privadas o possuem) e que os direitos trabalhistas tendem a ser respeitados (nunca são violados, na visão de 85% dos respondentes). No entanto, esses fatores não impedem que se verifiquem condutas antiéticas por parte das organizações:
• Frequentemente ou às vezes, 90% das companhias manipulam dados, relatórios ou informações financeiras para mascarar resultados próprios, segundo as respostas dos entrevistados;
• Para 55% das pessoas, as empresas adotam, frequentemente ou às vezes, comportamentos inadequados, tendenciosos ou de interesses pessoais, nos processos de seleção, contratação, promoção ou desligamento de funcionários;
• 41% dos respondentes disseram que a empresa já propôs, ao menos uma vez, reuniões em locais impróprios, como bares e casas noturnas;
• 85% dos entrevistados disseram que as organizações praticam algum tipo de discriminação (racial, social, sexual, quanto à idade ou doenças etc.) para com os colaboradores. Isso acontece frequentemente ou às vezes;
• Para 51% dos entrevistados, as companhias mentem para clientes, fornecedores e para o público em geral, visando interesses próprios, com frequência ou às vezes;
• Fornecer contribuições impróprias para outras organizações ou para agentes governamentais também é uma prática recorrente (48% das pessoas responderam que isso acontece frequentemente ou às vezes).
Nas questões que tratam da postura dos próprios colaboradores dentro das empresas, o resultado mais relevante refere-se ao uso de recursos materiais da organização para fins pessoais: 62% dos profissionais veem esse comportamento no dia a dia, com frequência ou às vezes. 59% dos entrevistados responderam já ter observado, ao menos uma vez, roubos ou furtos no ambiente de trabalho. De acordo com 20% das pessoas, bullying, assédio moral ou sexual são práticas que acontecem com frequência ou às vezes.
Os resultados indicam ainda que, segundo os entrevistados, comportamentos antiéticos não acontecem só internamente. Ao contrário, são observados também na relação com os stakeholders: frequentemente e às vezes, em clientes (para 34% dos respondentes), em fornecedores (para 42%), nos órgãos públicos (para 46%) e nos prestadores de serviço (para 35%).
Por fim, o estudo abordou questões voltadas à percepção que a sociedade tem de diferentes setores. As organizações de capital misto ou autarquias são as que têm a pior imagem: 81% dos entrevistados acham que houve aumento de condutas antiéticas nos últimos cinco anos neste setor; 69% acreditam que isso também aconteceu nas organizações públicas; e outros 32% nas empresas privadas.
“A percepção geral dos entrevistados é que houve melhorias quanto ao comportamento ético nas empresas privadas e piora nas empresas de capital público e misto”, afirma o professor Miguel Juan Bacic, do Instituto de Economia da Unicamp, e um dos responsáveis pelo estudo. “A análise dos resultados mostra que, mesmo tendo havido avanços nos últimos anos – tal como a implantação de códigos de ética -, há ainda um longo caminho a trilhar neste campo”, completa.
Os prejuízos gerados por comportamentos antiéticos serão sempre maiores do que eventuais vantagens obtidas. Como as ações antiéticas não podem ser documentadas ou formalizadas, elas ficam de fora dos controles da organização. Assim, os riscos aumentam substancialmente.